Norma ainda não estava nua, pelo contrário, revestida de uma beleza sem igual, andava pela rua, em zigue-zague. Acabara de chover, mas um calor intenso insistia em sua natureza exposta.
Alguns curiosos a olhavam e gargalhavam.
Ora ela chorava de pesar, ora ela sorria de esperança... e continuava no seu andar em
zigue-zague, em praça pública.
Aumentava cada vez mais o número de pessoas ao seu redor, mas
Norma não se importava, pelo contrário: queria mesmo que todos a seguissem.
Até que por aí passava um advogado, esbaforido, suor a
escorrer na face, gravata meio torta, paletó na mão, pasta na outra, há apenas
cinco minutos do tempo que lhe restava para protocolizar o Recurso no qual acreditava porque com muito esmero o concluíra: ética, argumentação, fundamento e justeza.
Passou e a olhara apenas com rabo de olho, dera mais uns
passos e repentinamente se voltara.
Ó senhora linda, também está aqui!
Norma lhe sorriu, ainda mais bela, e se achegaram.
Que bom reencontrá-la para o povo, vez que não somente eu a carrego comigo, disse-lhe o advogado. Em seguida, pôs a mão na pasta e acariciou o couro reluzente.
A multidão bradou:
Olha o doido! Agora são dois doidos!
Foi quando o advogado rasgou de vez a roupa de Norma. E ela
lhe abriu mais os braços e o abraço se tornara mais forte.
A maioria, extasiada, passara a aplaudi-los. Sobremaneira,
pela coragem de estarem a praticar ato tão condenável pela parte incauta da
sociedade hodierna (?).
Eles estão praticando um crime! Vamos prendê-los! Chamem a
polícia! Bradou a minoria.
A polícia chegou, mas incompreensivelmente para os presentes,
passara também a aplaudir os dois supostos agentes de ilícitos. Ato contínuo, Norma sorria. E sorria e sorria... e os dois se amavam, muito mais, ela e o advogado, aí, mesmo.
O defensor do Direito olhava em seu relógio, mas não se desgrudava da mulher.
Até que, após o devido ponto final, falou em seu ouvido: vem comigo, Norma! Colocou
seu paletó sobre os ombros dela e caminharam para o destino dele.
Surgira do nada um uníssono, todo vestido de preto, com dentes reluzentes por conta do ouro, que assim bradou: Vou prendê-los no inferno! Aqui, não servem pra nada! Vou prendê-los no inferno! Repetiu.
Não!!! Deixa ela livre!!!! Retratou-se a minoria.
Então, só vou prender ele, que não tem princípios! De Novo o
uníssono.
O advogado, calmamente, argumentou:
Senhores policiais, sou advogado e só tenho trinta segundos
para passar por aquela porta. E lhes apontou o Fórum. Prometo-lhes que depois da audiência de instrução,
volto aqui e se assim entenderem ainda poderão me prender em
flagrante! Mas sabem que sairei livre na audiência de Custódia.
Ao que os policiais, responderam em coro: flagrante, nada! Sabemos
que os Doutores não esquecem os Princípios! Ademais, advogados devem mesmo comer as normas, mesmo em praça pública, Doutor.
Corta! Disse o diretor. Valeu, atores! Boa interpretação da Norma!
A cena foi pro ar na novela das nove e o acussado saiu solto.
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