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12/11/2017

A ESCRAVIZAÇÃO HODIERNA COMO PERDURAÇÃO DE ASPECTO NEGATIVO AO DIREITO DO TRABALHO.


RESUMO
Muito já se explorou a mão de obra, fazendo com que uns escravizassem outros, e mesmo findo o século XVIII ou em tempos menos remotos os trabalhadores ainda se sentem oprimidos, desrespeitados. Hodiernamente, não obstante a fleuma do capital, ainda se observa resistirem esses intentos, mesmo após o advento de institutos que prezam a dignidade da pessoa humana.
O mundo vive em constante mudança, porquanto o que somente deveria  ser modernização e crescimento em todas as áreas, nalguns casos parece mesmo pretender afastar tal obviedade.
De modo que a qualquer imposição, principalmente no Direito do Trabalho, não pode haver resiliência, pelo contrário, há de remanescer uma luta permanente por sanear de pronto essa mácula humana, vez que querência torta não pode persistir.
Por conta disso, é preciso voltar um pouco à história, para quem sabe repensarmos nossos valores, até então aplicados sobre o hipossuficiente: o empregado. Ou trabalhador.

Palavras-chave: mácula humana, fleuma do capital, resiliência, modernização e crescimento.
ABSTRACT
Much labor has already been exploited, causing some to enslave others, and even at the end of the eighteenth century or in less remote times workers still feel oppressed, disrespected.
In spite of the phlegm of capital, it is still possible to resist these attempts, even after the advent ofinstitutes that cherish the dignity of the human person.
The world is constantly changing, because what should only be modernization and growth in all areas, in some cases it seems even intended to remove such a truism.
So that any imposition, especially in labor law, there can be no resilience, on the contrary, it must remain a permanent struggle to sanitize this human stain at once, since crooked grace can not persist.
Because of this, it is necessary to go back a bit to the story, for those who know how to rethink our values, hitherto applied on the hyposufficient: the employee. Or worker.


Key words: human macula, phlegm of capital, resilience, modernization and growth. 

                                                        INTRODUÇÃO
 O trabalho não pode ser uma lei sem que seja um direito.
Victor Hugo.                                                                              
Abrimos este artigo dizendo que longe de pretendermos ser desrespeitosos, porque somos positivistas e assim heteronomamente devem su portar os cidadãos na sociedade, embora devêssemos estar mais felizes de viver na concepção de Estado-Cidadão conhecido como o modelo dos Três Poderes, bem pensada por Montesquieu, mas tal como encontra-se o mundo, numa situação de incertezas, e, no caso do Brasil não é de menos, vez que o povo labuta por empregos e o Estado tornou-se máquina  inchada a dar força a opções diversas e erigir leis nem sempre aprazíveis, com menor proporção aos interesses sociais difusos e isonômicos instantâneos, por ora esquecendo-se de que todos são iguais perante a lei, não devendo ser feita nenhuma distinção entre pessoas que habitem um mesmo território e se encontrem na mesma situação de insatisfação, ao ponto de clamarem alguns por mudanças radicais no sentido da reconstrução do Estado de modo a levantar-se do seu sono de gigante adormecido. No caso da busca pelo crescimento econômico, as alterações nas leis trabalhistas se foram necessárias, também não foram motivo de satisfação plena. As decisões de Estado são mesmo complexas.
O objeto é abordar alguns aspectos relevantes do Direito do Trabalho. Evidente que muito nos batemos em extrair da historicidade não somente o que mais nos apraz, mas também o que nos possa satisfazer no sentido de aprofundarmos o estudo desta seara dita tão complexa. Diz-se complexa porque não se ignora as agruras porque passaram nossos ancestrais servis, quão labutaram os operadores do Direito na busca de alcançar o mundo progressos nesse métier e como enxergamos a situação atual.
No caso do Brasil, que é o nosso objeto, reitere-se, em que pese hodiernamente termos promulgado a atual Carta Magna em que primamos pela condição valorativa do trabalho, ainda se vê, aqui e acolá, mesmo nos grandes centros, persistências no sentido de manter ‘coisificado’ o trabalhador, em posição de escravo e fonte de alimento de uma máquina rejeitável.
Porquanto, com toda a luz aos constituintes a nossa Carta Magna já no artigo 1º, inciso IV, ensina a importância dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa para a República, eis um dos seus princípios fundamentais, lei e direito tal como pensou Victor Hugo.
Porque em um estado democrático de direito o Parlamento se renova, é-se de presumir que sempre para o melhor da nação, o que infelizmente nem sempre acontece visto que a volitividade dos novos legisladores por vezes difere da dos constituídos.
Por sorte, o estado democrático de direito ainda mantém a sua face voltada para o Norte, a nossa gente, ainda que mui lentamente, vem deixando de ser mera espectadora desse casuísmo e aos poucos passando a povo, no sentido amplo das Ciências Políticas, ao reconhecer que o suor provindo do trabalho é o que conduz a Pátria a uma reflexão do melhor uso do exercício do voto. Na data de 13 de outubro de 2017, o Ministério do Trabalho editou a Portaria nº 1.129, a qual suprime alguns conceitos da Organização Internacional do Trabalho (OIT),  alcançando o Código Penal. 
Em conclusão deste ponto, há uma grita parlamentar que entenda ser a conveniência ou o avocar benesses a pretender resgatar as correntes como o único elemento de caracterização de trabalho escravo. Particularmente, podemos dizer que  a nova ordem mundial, em que o conceito de empregador e empregado, artigos 2º e 3º da CLT, à exegese orienta no sentido sinalagmático das obrigações, sem desprezo da dignidade da pessoa humana, artigo 149 da mesma Lei:
Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhados forçados ou a jornada excessiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.
Pois bem, no sentido de dar segurança jurídica, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se. Em 25 de outubro de 2017, a ministra Rosa Weber decidiu em sede de liminar questão relevante, o que levou nossos legisladores a pensar em nova redação para o tema.
Fincados em tal esperança, deixamos aqui esta como oração em prol desses escravizados ou miseráveis sem voz:
Por suas mãos calejadas e enegrecidas
Do carvão e de outros e de outros...
Quenão lhes deveriam ser miséria,
Mas tão-somente labor e renda;
Ou por suas almas semimortas, 
Porque malmente se alimentam.
Olhai seus olhos de azeviche ao Céu,
Embora muitas vezes nem aviões avistam,
Olhai suas peles rasgadas dos espinhos da mata,
As batidas angustiantes dos seus corações,
Afastai-lhes as miras do mal
Pela saudade dos seus.
Pela esperança e amor em Vós, Senhor,
Agradecemos.
Amém
CONCEITO DE DIREITO DO TRABALHO.
Repetiremos tal como exposto em outro artigo nosso, intitulado Prejuízos Biológicos ao Empregado, que não obstante Direito, e evidente o do Trabalho, como bem o define Maria Helena Diniz, é “ordenação heterônoma das relações sociais, baseada numa integração normativa de fatos e valores”.
Definido por Miguel Reale Jr,  “Direito é a ordenação heterônoma, coercível e bilateral atributiva das relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos e valores.
A expressão heterônomo vem do radical grego 'hetero',  'diferente', e em Direito significa cumprimento, obediência às leis, sejam justas ou injustas, vez que estas são legisladas a fim de imposição de determinado valor. O filósofo Immanuel Kant, para quem o imperativo categórico é fundamentado na moral, utilizou a expressão “heterônomo” para definir o Direito, o que não significa dizer que concordasse com o injusto.  Apenas dizemos que o Direito do Trabalho é heterônomo porque é lei e como tal deve ser obedecido. De modo que hermeneuticamente é convergente o pensamento de Victor Hugo, reiteramos o exposto na introdução. O Direito do Trabalho visa a proteger a dignidade das pessoas, ou seja, abarcado no Princípio Protetor o trabalhador, que é hipossuficiente na relação do contrato de trabalho, não pode ter somente adstrito à lei (CLT) os seus direitos,  mas também tem o bônus de gozar de Princípios, conforme preceitua Miguel Reale esses “são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, a aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas. São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis".
ALGUNS ASPECTOS RELEVANTES DA HISTÓRIA INICIAL DO DIREITO DO   TRABALHO E A ATUAL INFLUÊNCIA DO CAPITAL NOS ESTADOS.
Pois é, quanto suor e sangue foram derramados. Não nos cansamos de repisar as agruras por que passaram os trabalhadores ao longo da história. Desde os tempos bíblicos ao Império Romano, carregaram pedras por construir castelos, até mesmo as próprias masmorras.
O marco mais relevante surge mesmo com a Revolução Industrial, visto que a oportunidade de se construir riquezas suplanta todas as dores operárias, ignorando-se as condições desumanas a que ‘todos’ os trabalhadores servis eram submetidos.
Destarte, vivemos os áureos tempos do contrato de trabalho como instrumento da lei, dando margem aos contratos coletivos; a igualdade como pressuposto para combater a desigualdade e se chegar à igualdade coletiva; o capitalismo selvagem, com seu pensamento econômico, apenas visando lucro, mas querendo ostentar ser por conta do social, e que levou ao conceito de globalização (abertura da economia para a entrada de multinacionais), ainda perdurando a mão invisível do mercado, definido por Adam Smith; chegamos ao pensamento político do liberalismo, e, logo tentando se escapar do intervencionismo estatal,  as potências econômicas com suas ideias políticas forçaram o advento do neoliberalismo, fundado em razões de que atuando com liberdade de comércio, o que significa livre mercado, poderão garantir o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país. Eis sempre imperiosa a mão invisível do capitalismo selvagem, vez que passam a definir políticas financeiras, políticas de emprego e/ou sociais, ocupam o lugar do estado somente quando lhes interessa, mas deixam a esse o ônus do fracasso social, quando por bem entendem demitem e migram como aves famintas. 
Como cidadãos e povo temos sempre de pensar sobre o papel da política macroeconômica, quando em detrimento do social. Sindicatos fortes são necessários, porque é o seu dever lutar pela classe que representa; fatiamento ou pulverização de sindicatos é condenável porque enfraquece ainda mais o hipossuficiente. De certo, o judiciário trabalhista não é moroso, nem exíguo no julgar, como pensam alguns, pelo contrário, a considerar o número de ações que recebe, reve muito suor, prima muito pela celeridade e, grande e justo, não declina de reconhecer algum direito do trabalhador, se cabível. Intrinsecamente, voltamos a pensar no Princípio Protetor, ademais cujas palavras do eminente professor Antero Arantes Martins: “Princípio é verdade porque é”. “Sem a devida proteção ao trabalhador não haveria porque existir o Direito do Trabalho”. O professor Amauri Cesar Alves faz referência a Adalberto Moreira Cardoso o qual compreende a estratégia do capital consistente em “remercantilização da força de trabalho”, pois o que pretende o neoliberalismo é o retorno da relação capital-trabalho ao status que lhe conferiu no nascedouro o liberalismo, quando tal vinculação era vista como um ajuste contratual qualquer e que, consequentemente, permitia a plena incidência da autonomia das vontades. Seria, em síntese, o retorno das relações trabalhistas às leis de mercado.
Por “deslegitimação do Direito do Trabalho”  pode-se entender a estratégia patronal no sentido de passar aos trabalhadores a ideia de que seus direitos não são verdadeiramente garantidos, posto que são impunemente descumpridos. De modo que descumprir a norma trabalhista é um risco calculado e assumido pelo empregador que, muitas vezes, garante duplo resultado: economia de dinheiro e enfraquecimento da efetividade das normas trabalhistas.
Além do mais, os capitalistas testam “os limites da nova ordem constitucional, num ambiente em que os trabalhadores organizados não conseguem impedi-los e o órgão fiscal do Estado parece desinteressado nisso…”, o que resulta em decisões que privilegiam as teses dos empregadores em detrimento dos mais comezinhos princípios de direito constitucional e de direito do trabalho. Assim, diante de todo o exposto, pode-se inferir que os capitalistas conseguiram manter a política neoliberal da década de 1990 presente até os dias atuais através da “flexibilização da legislação a sangue-frio”. Se não é mais possível contar com o Estado para patrocinar a flexibilização das leis trabalhistas, então o recurso utilizado é o do descumprimento das normas, o que garante, em muitos casos, o mesmo efeito verificado pela alteração legislativa, que é a economia de recursos financeiros em troca da precarização da contratação de força produtiva.
Neste sentido Adalberto Moreira Cardoso, continua Amauri Cesar Alves: “A ilegalidade, então, não é outra coisa senão a versão mais crua da luta de classes: os empresários, em lugar de tentar interferir nos processos legislativos para que sejam produzidas leis que os favoreçam, preferem atuar a frio no mercado de trabalho, recusando-se a acatar a Constituição Federal em momento bastante desfavorável para os trabalhadores, assolados por altas taxas de desemprego e pela informalização crescente do mercado de trabalho.”
E Amauri Cesar Alves conclui:
Diante do exposto e em síntese é possível concluir que o Direito do Trabalho, ainda hoje, desempenha importantes funções no contexto capitalista mundial, sobretudo em países de capitalismo periférico, como o Brasil. Além das clássicas funções protetivas, é também papel desempenhado pelo Direito do Trabalho a legitimação da relação produtiva básica do capitalismo, sendo certo que o sistema atual acaba por fazer com que a classe trabalhadora em geral se preocupe somente em manter suas conquistas, não tendo então oportunidade de lutar por ampliação do patamar civilizatório mínimo e, muito menos, para questionar sua própria situação de explorada.
Não obstante tenha papel fundamental a desempenhar no Brasil, o Direito do Trabalho sofreu forte combate e enfrentou severa crise na denominada “Década Neoliberal”, período compreendido sobretudo entre os anos de 1993 e 2002, quando o Poder Executivo Federal não mediu esforços para flexibilizar seu conteúdo normativo protetivo.
Hoje, sem que haja uma política de Estado no sentido da flexibilização dos direitos trabalhistas, parece haver o que Adalberto Moreira Cardoso bem denominou de “flexibilização a sangue-frio do Direito do Trabalho”. Tal política capitalista consiste, basicamente, na deslegitimação do Direito do Trabalho através do descumprimento das regras trabalhistas, de modo sistemático, pelo empregador.
Resta aos juristas comprometidos com a preservação do  Direito do Trabalho, bem como aos Advogados, Juízes, Representantes do Ministério Público, Auditores Fiscais do Trabalho, dentre outros, o caminho da atuação positiva através da interpretação do direito posto, vez que não se pode contar com o Congresso Nacional para a promoção de melhorias nas condições normativas sobre o tema.
É necessário, então e por fim, entender o Direito do Trabalho  como direito constitucional fundamental, modo de realização da dignidade da pessoa humana e dimensão dos direitos humanos, bem como seus princípios basilares como normas jurídicas aptas à regulação das relações de emprego e à concretização, no plano da interpretação, da finalidade precípua e inafastável deste ramo jurídico, que é a de melhorar as condições de existência daqueles que vivem do seu esforço diário em proveito de outrem. Destarte, igualmente defendemos a flexibilização dos direitos trabalhistas, no sentido de se ajustar parâmetros conservadores, no entanto sem menosprezo do contrato de trabalho, que tal como veremos adiante é fonte concreta para julgamento das lides, muito menos recomendamos a esmo os contratos tácitos, dando preferência aos expressos, por escrito e com prazos determinados (artigo 443, CLT), bem como repudiamos qualquer tentativa que pareça  a retomar, aventar, transmudar a escravidão, abolida em 1888.
ALGUNS ASPECTOS RELEVANTES NO CONTRATO DE TRABALHO.
Extrai-se do artigo 442 da CLT  que o acordo, tácito ou expresso, possui natureza contratual, por vontade das partes, e corresponde à relação de emprego, seja na forma escrita ou verbal, por prazo determinado ou indeterminado.O contrato é sempre de suma importância para se mensurar o direito das partes. O seu aspecto relevante é positivo. Muitas são as teorias para definir a natureza jurídica do contrato de trabalho, ponto que não nos alongaremos aqui, para não fugirmos do objeto deste trabalho. No entanto, podemos lembrar que há a civilista, a institucionalista, a contrato realidade, a contratualista, a acontratualista.
Nesta última, podemos dizer que por conta do alto índice de desempregos, o trabalhador submete-se a laborar com total desconhecimento das cláusulas do contrato de trabalho, incorrendo-se em prejuízos tão relevantes que possam remetê-lo à condição análoga a de escravo.
Em tese, parece-nos trafegar neste ponto a vontade da Portaria nº 1.129, a qual trabalharemos adiante. Mas por ora, deixamos registrado que “possivelmente logo chegaremos a uma nova natureza jurídica do contrato de trabalho: ‘the broken labor security’ ou seja a quebra da segurança, na qual o Estado abrirá mão de vez de amparar o trabalhador e o jogará aos leões do capital, mas continuado a dos dois se alimentar.
Embora pareçam contramão da história as recentes alterações na legislação trabalhista, a exemplo de empregado e empregador negociarem livremente, ou seja, sem a interferência de sindicatos, sobre que muito se discute, porque pensa-se em prejuízos adiante, mas pelo contrário, não tememos dizer que vem a  desprender o empregado de certo vínculo compulsório, o que também não lhe dá garantia de estabilidade, tampouco de que terá feito mal negócio.
Evidentemente, há imperatividades a serem consideradas, tais como:
O que se faz presente é sempre o capital interferindo no Estado e, em consequência, no trabalhador.
O que se faz necessário é uma nova consciência da necessidade de um sindicato forte e sem outros interesses que não somente o do trabalhador, ou seja, sem vínculo com outras ideologias, por, assim, atrair o associado livre e cognitivamente. O que se faz ultranecessário é sempre a educação do povo. Porquanto o trabalhador quando educado será bem informado; quando bem informado saberá negociar livremente com seu empregador, sem se esquecer de que nalguns casos é sempre recomendável previamente consultar um advogado.
A ESCRAVIZAÇÃO HODIERNA COMO ASPECTO RELEVANTE AO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL.
Reiteramos não tratar este artigo de ideologia.  Mas  o  que  vemos  através da respeitável Portaria  nº 1.129, criada para alterar o conceito de trabalho, e criticada pela Procuradoria Geral da República, pelas Nações Unidas, pela sociedade brasileira, por muitos por assim entendermos sobremaneira ferir a Carta Magna, particularmente entendemos também ser uma tentativa de adaptação da lei à situação, a considerar que dos resgatados, à luz da CLT, tidos por encontrar-se em situação análoga à de escravo, artigos 149 – Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhados forçados ou a jornada excessiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto; e 462, § 2º, - É vedado à empresa que mantiver armazém para venda de mercadorias aos empregados ou serviços estimados a proporcionar-lhes prestações "in natura" exercer qualquer coação ou induzimento no sentido de que os empregados se utilizem do armazém ou dos serviços, a exemplo dos cortadores de cana-de-açúcar, noticia-se que muitos retornam à situação anterior, por não encontrarem meio diverso de sustento: neste caso, a Portaria consagra a pretensão de ‘remendar uma lacuna social’, que é a falta de emprego para esses trabalhadores braçais. Eis, portanto, uma questão relevante e paradigma do Direito do Trabalho, que somente poderá ser quebrado e/ou superado por uma efetiva política educacional, para que não se fale por ora em violação sumária do Direito do Trabalho, mas sopese a ultra necessidade de se pensar em nossas crianças, filhos desses operários e que necessitam dos pais em seu dever-ser de as alimentarem. A conclusão seja em condição de trabalho escravo, ou não, esses trabalhadores têm filhos ou famílias por serem alimentados e o Estado fracassa no seu status prior de primar pela educação, o que é tão controverso quanto a referida Portaria.
O aspecto relevante da escravização é negativo. Por isso que a Portaria não vingou. Até o presente momento, está-se a refazê-la. Aprimorá-la.
Não obstante a complexidade que se lhes apresenta — ao Estado,  e aos tidos pela Portaria em tela como não-trabalhadores análogos à de escravo —, embora não esteja aqui o objeto legislar, ou trabalhar a política tributária, para sanear essa ideia contida na Portaria, e preservar o binômio liberdade-dignidade, sugere-se melhor seria manter os preceitos já conquistados, facilitando ao produtor, ou à empresa compradora do produto em pé, efetividade obrigacional patronal, a exemplo do recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço em patamar aceitável, criando-se para o artigo 15 da Lei nº 8.036/1990 o parágrafo oitavo, com a possível alíquota a que se refere o caput do artigo em tela reduzida para seis por cento.
Muito já se ouviu sobre o fático análogo a trabalho escravo: quer da cana-de-açúcar, quer do cacau, quer do sisal, quer de pedreiras, quer de vestuário... Nalguns casos, o probatório não se sustentou ou não suplanta a realidade. Mas não exista essa ignomínia, louve-se aos céus.
Nós mesmos vimos de perto, ainda na infância e quando já vigorava a CLT, mesmo que por volta de setenta anos após a abolição da escravatura, nossos pais labutarem na lavoura, a bater com a enxada num solo infértil, em busca de êxito em sua agricultura de sustento. Ainda que fossem dos mais abastados entre os não-abastados, por altruísmo contratavam vizinhos e comiam juntos nacos de carne seca com punhados de farinha. Todos análogos a escravos de si próprios, porque se sujeitavam a condições degradantes de trabalho.
Aqui, a consistência interpretativa para se dar a analogia esperada a trabalho escravo reside em que se livres para irem, ou ausentes do vínculo em ‘cadernetas de haver’, nada recebiam, a considerar que um punhado de farinha não supre necessidade operária, bem como é de lembrar que o nosso Estado do fim do século XX, ainda buscava um caminho na direção do mundo.
Oportuno citarmos parte de um texto da nossa obra PINGOS DO MEU PENSAR:
Sou de onde alguns desnudos nunca se saneiam dos cautérios, porque indenes às Leis transformam o Febo em inclemente, ao usar Sua beleza e esplendor por rasgar mais e mais as costas daqueles que lidam subsistentemente com quebrarem pedras que os fazem perder de pronto vistas. Há ainda os golpes lépidos das máquinas podres de lamberem agaves, nos quais se lhe verem irem as tão necessitadas mãos.
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Por isso, nem.as dores malcriadas que sofro, péssimas visões, e saudades reavivadas de amores perdidos que se me batem a toda hora, como canções líricas: ora doídas e longas, ora belas e passageiras,veias expostas, ancoradas em meus paralelepípedos, chafarizes de sangue, a salpicar meu corpo, páginas abertas, sabor de sal e cor de chocolate de ilhéu, me fazem desistir do verso e da prosa.
Por tal como posto na introdução, infere-se que não há suor sem dor, nem dor sem esperança. Embora oficialmente temos que a escravatura acabou no século XIX, se sempre não a esteve parece recrudescer nalgumas mentes.
Angela Tacca Fabris lembra as palavras de Edmundo Moniz: “pode-se dizer que o desenvolvimento inicial do Brasil se fez sobre o suor, o sangue e o sacrifício do negro”.
PRETENSÕES POLÍTICAS NO SENTIDO DE ABRANDAR ESSE QUADRO DEGRADANTE.
Nesta parte, precisaremos filosofar um pouco: há pensamentos que sustentam para a geração de empregos faz-se necessário mudanças na legislação trabalhista, ainda que tragam prejuízos ao trabalhador. Já falamos sobre a importância do contrato de trabalho.
Em que pese criar-se empregos seja uma necessidade social, com todas as vênias entendemos que a tentativa de abrandar o trabalho análogo a escravo no Brasil, por meio de facilidades ao empregador, sobrepuja sobremaneira a dignidade humana do empregado ou trabalhador, este que há muito vem perdendo mesmo em lícitos Acordos, ou Convenções, a considerar a submissão ao capital.
Muito longe da pretensão de distorcer finalidade, vemos que quando determinada categoria para, por conta de outra determinada reivindicação, esta não se sustenta por muito tempo. Agora, imaginemos todas as categorias paralisassem ao mesmo tempo, e não retornassem ao trabalho, sob nenhuma situação, ou seja, não se submeteriam a Acordos, ou Convenções, quanto influenciariam na economia, quantos não seriam reeleitos, quantos governos derrubariam. Há países, a exemplo os Estados Unidos da América, que inexistente Justiça Trabalhista, fortemente são os sindicatos, ou seja, sequer se imaginaria abuso de empregador.
Mas nessa esteira o que mais se haveria de temer é o caos social, o despreparo do nosso operariado — que muitas vezes conduzido por idealistas negativos, perigasse transformar a nossa púbere democracia em anarquismo.
Por conta disso não se apregoa baderna, desobediência civil e social — vez que o trabalho tem fundamento no social e é alicerce econômico —, pelo contrário, num estado democrático de direito sustenta-se a classe trabalhadora em sindicatos fortes e em legisladores e outros agentes políticos que residam no bem coletivo.
Um Parlamento ainda que próximo do ‘fifty fifty’ pendula, mas forma a maioria se um dos seus membros, que seja, excede denodado ao bem do povo, porque cada vez mais alimenta e revigora a democracia e nesse bom exemplo inspira os passivos e os jovens que vêm atrás com seus sonhos e ideais.
Não há como fugir de que cabe à educação não fundamentalista, apartidária, formar as gerações e fazer crescer o cofre do Estado em prol do seu crescimento como nação. O que nem sempre ocorre, posto que por adesões a um mundo ora torto, por conta de inflamados idealismos negativos que extrapolam toda a essência do pensamento moderno, analfabetos políticos, lavados cerebral e ideologicamente aceitam quaisquer bandeiras e discursos em tons inflamados. Até esquecem de trabalhar e produzir, por apenas aplaudirem sem noção do que aplaudem.
É através da filosofia que se questiona verdades, pois.
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
O trabalho tem fundamento no social e é alicerce econômico, num estado democrático de direito sustenta-se a classe trabalhadora em sindicatos fortes e em legisladores e outros agentes políticos que residam no denodo ao bem coletivo.
O trabalho análogo à escravo envergonha ao escravizado e possa envergonhar a quem escraviza. Quanto ao Estado, para também não ser envergonhado, urge ceivar-se desse fato. Mas não com abrandamento e reforma das leis trabalhistas tão duramente conquistadas. No século XXI o trabalhador não pode retornar à condição análoga a de escravo. Suspensa liminarmente a Portaria nº 1.129  de 13 de outubro de 2017,  melhor nem a retorne modificada, mas seja-a revogada. Pela dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
ADAM SMITH in A Riqueza das Nações. Tradução de Alexandre Amaral Rodrigues e Eunice Ostrensky, São Paulo: Martins Fontes, 1a ed., 2003. O filósofo (1723 – 1790) é considerado o pai da economia moderna, o mais importante teórico do liberalismo econômico.
AMAURI CESAR ALVES in NEOLIBERALISMO, “FLEXIBILIZAÇÃO A SANGUE-FRIO” E DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL Artigo publicado na “Revista LTr.”, ano 74, outubro de 2010, São Paulo, SP, págs. 1245 a 1255. Apud CARDOSO, Adalberto Moreira. A Década Neoliberal e a crise dos sindicatos no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003, pág. 126,127,144,173,186 e 187.

ANGELA TACCA FABBRIS in Contrato de Trabalho – Evolução e Contemporaneidade.Memória Jurídica, 2006. p.14 Apud EDMUNDO MONIZ in Segadas Viana et alli. Instituições de Direito do
Trabalho. Vol. 1, 21ª ed. LTr,2003, p.29, São Paulo.

ANTERO ARANTES MARTINS. Desembargador no TRT-2. Coordenador pedagógico e professor do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Material e Processual do Trabalho da Faculdade Legale. CHRISTINA DE ALMEIDA PEDREIRA in REFLEXÕES SOBRE A REFORMA TRABALHISTA. Scortecci Editora, 2017.

DINIZ, MARIA HELENA in Curso de direito civil brasileiro, 2012. 
Visitado em 10 de novembro de 2017.

KANT, IMMANUEL in A Metafísica dos Costumes. Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2003

REALE, Miguel in Lições Preliminares de Direito. 7a ed., 1980.

REALE, MIGUEL in Lições Preliminares de Direito. 22ª ed. São Paulo. Saraiva, 1995, p. 299.


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O autor é formado em Direito pela Universidade Nove de Julho – UNINOVE.
Pós-graduado  lato sensu em Direito Penal e Direito Processual Penal pelo  INESP – Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa.   
Pós-graduado lato sensu em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela faculdade Legale.
Pós-graduando lato sensu em Direito Previdenciário pela faculdade Legale.
Professor para segunda fase do Exame de Ordem da disciplina Direito Processual Penal.

Escritor e poeta: Autor das obras DELLARQUIM. ISBN nº 85-905108-1-6 e FIM DE SEMANA EM PINDORAMA (A Dialética do Óbvio ou O Dia Em Que Ninguém Saiu de Casa). ISBN nº  85-905108-2-4 entre outros.
Blog: http://jmmonteiras.blogspot.com.br/














Um comentário:

  1. Parabéns, muito orgulho dos meus queridos alunos. Com carinho de sempre. Profa.Angela Tacca
    advocacia.tacca@gmail.com

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